quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Empreendedorismo Sénior

Velhos

Empreendedorismo Sénior

Há já mais de três longuíssimos anos que o chefe deste governo nos disse que vivíamos “acima das nossas possibilidades” e que, por isso, era necessário, “custe o que custar”, fazer “reformas” no Estado e no nosso modo de vida.

Duas das medidas a que lançou mãos, com “fervoroso desvelo”, foram o aumento (brutal) dos impostos, e o roubo (mais conhecido na “gíria” dos governantes por “cortes”) nos salários e nas pensões.

No meu caso, que vivia com o meu orçamento anual, estabilizado entre aquilo que recebia de pensão, por um lado, e os compromissos a honrar, e um dia a dia sem luxos nem extravagâncias, por outro, aconteceu que, com tal “zelo governativo”, passei a viver, desde 2011, abaixo das minhas necessidades.

Ora, recentemente veio a público que este país, o meu país, é um dos melhores destinos, senão mesmo o melhor, para os reformados dos outros países parceiros na União Europeia viverem as suas reformas. Isto deixou “felicíssimos” os nossos governantes, que viram deste modo o “reconhecimento internacional” da “bondade” das suas medidas.

Como continuava a viver abaixo das minhas necessidades, fui à procura de como ultrapassar a situação.

Curiosamente, na mesma altura debatia-se a questão da “deslocalização” das sedes das empresas cotadas no PSI 20 para o Luxemburgo, porque lá encontravam, diziam (dizem), menos burocracia para desenvolver os seus empreendimentos, e menos impostos a pesarem sobre os seus dividendos.

E tive uma epifania: e se eu me “transformar” numa “empresa uni-pessoal” e “a deslocalizar” para o Luxemburgo também?

Claro que constituir uma “empresa uni-pessoal” exige determinados procedimentos que, face à prática burocrática corrente, poderá atirar a conclusão do processo para as “calendas gregas”.

Aqui daria jeito a velha “cunha”, ou “palavrinha”, como também era conhecida. Mas os tempos são outros, novas tecnologias são usadas, exigindo novos conhecimentos. Pus-me a estudar.

E concluí que, para concretizar a minha transformação em “empresa uni-pessoal”, eu tinha que fazer um “upgrade” de mim próprio (a começar por utilizar uma linguagem mais “in”, neste processo de globalização em curso). O que eu precisava era de uma “assessoriazita” que me pusesse “on”. Nada que os nossos governantes não usem “às mãos cheias”, com gente que “acabou de obter adequados conhecimentos, apresenta relevantes experiências de vida, e tem perfeito domínio do trabalho em rede (“network” para “os da casa”).

Disseram-me para procurar essa “assessoriazita” nas “juventudes da alternância”, (“ninho de saber” onde os nossos governantes também se “abastecem”), pois nelas encontraria pessoas muito bem informadas e ainda melhor relacionadas, pois sem informação e sem relação não há assessoria que resista.

E uma vez que cheguei há pouco a sénior – sou um jovem sénior! -, creio que reúno as melhores condições obter um acordo de “prestação de um serviço de assessoria” com os seguintes objectivos:

1. Constituição de uma “empresa uni-pessoal” em meu nome.

2. Deslocalização desta empresa para o Luxemburgo. (Disseram-me que estas assessorias também actuam em zonas mais “profundas”, de redes mais “subtis”, devidamente resguardadas de todos os “olhares indiscretos das diversas fiscalidades”, que vão das Ilhas Caimão a Singapura, passando por outros sítios de que não fixei os nomes, mas que nesta “área de negócio” não cabem as pensões, só os milhões).

3. Transferência mensal da minha pensão para a minha “nova sede”. (Pagar-se-ia uma “comissãozita” (será “commission” que devo habituar-me a dizer?) bancária (de valor reduzido, claro!).

4. Pagamento dos devidos impostos, a taxas muito favoráveis, ao fisco luxemburguês.

5. Retorno da pensão para o “meu” banco aqui. (De novo, a “commission” seria um valor adequadamente suportável).

6. Cessação do pagamento de impostos (IRS) ao fisco do meu país. (Nada que os grandes “empreendedores” não façam já há muitos anos, com o “aplauso” dos nossos governantes, pois trata-se de uma “internacionalização” que é uma “mais-valia” para o país nas suas relações dentro, e fora, da União Europeia.

Já imaginaram quão bom seria se todo os mais de 2 milhões de reformados seguissem este processo? É que todo ele seria uma “demonstração inequívoca” do postulado matemático “menos por menos dá mais”: menos impostos (IRS) e menos burocracia “dá” mais ganhos para os bancos (aqui e no Luxemburgo); mais impostos para o Luxemburgo (um “bónus” para o seu orçamento, que até pode conduzir a taxas ainda mais favoráveis para nós – a nossa quantidade compensaria essas “reduções”); mais disponibilidades financeiras para nós, permitindo o aumento significativo quer do valor das poupanças (o que poderia ajudar a diminuir o montante da dívida soberana), quer das despesas de cada um de nós (o que elevaria o montante dos impostos arrecadados pelos nosso governo – IVA e IRC, por exemplo).

Empreendedores seniores unidos por um país mais desenvolvido!

Vamos fazer deste país um país para TODOS os velhos!

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